Uma série de depoimentos emocionados diante da decisão da prefeitura de desalojar o movimento comunitário de suas sedes nos bairros de Caxias do Sul, sob a alegação de transformá-los em UBS e creches, marcou a audiência pública promovida pela Comissão de Educação, Cultura, Esporte, Lazer e Inovação na noite de terça-feira (17/10) na Câmara Municipal.

Convocada pelo Conselho Municipal de Políticas Culturais, cujas atividades dependem dos espaços localizados nos centros comunitários administrados pelas Associações de Bairros de Caxias do Sul, a assembleia se estendeu por quase três horas. Foi presidida pelo vereador Edson da Rosa/PMDB, com a participação dos vereadores Paulo Périco/PMDB, Ana Corso/PT, Kiko Girardi/PSD, Renato Oliveira/PCdoB, Rafael Bueno/PDT, Adiló Didomenico/PTB e Paula Ioris/PSDB.

O Poder Executivo, embora convidado, preferiu não comparecer sob a justificativa de que o assunto está nas mãos da Justiça. A audiência no Fórum reunirá a União das Associações de Bairros (UAB), que defende os interesses das Amobs, e a prefeitura. Será no dia 26, quinta-feira, às 14h, no Fórum.

O tom dos debates foi dado pela presidente do Conselho, Caliandra Troian, que manifestou a apreensão do movimento cultural caxiense ante à intenção documentada do Executivo de tomar espaços de empoderamento como os centros comunitário, estruturas que abrigam diferentes atividades de integração social  dos moradores dos bairros e loteamentos.

Na avaliação de Caliandra, sem estes espaços para realizar o que preconiza o Plano Municipal de Cultura, o processo de levar aos bairros uma programação que valorize os artistas locais está ameaçado.

A experiência de vida descrita pelo MC Chiquinho de Vilas, rapper há mais de 20 anos, que foi acolhido no centro comunitário do bairro Euzébio Beltrão de Queiróz para desenvolver sua arte e ter uma chance de superar o ambiente hostil do consumo e tráfico de drogas, revelou a importância de espaços comunitários numa sociedade em que continua faltando diálogo, tanto em casa com os pais quanto na rua.

Graças ao convívio proporcionado pelo Centro Comunitário, hoje Chiquinho se dedica ao movimento cultural trabalhando com hip hop nas escolas. Ele criticou a falta de sensibilidade das autoridades que não compreendem a dimensão e os vínculos que se criam entre a população dos bairros e o esforço para tirar as crianças das ruas. E alertou a Prefeitura que a juventude da periferia vai reagir de todas as formas para impedir o que classificou de “sequestro” dos centros comunitários.  

O presidente da UAB, Valdir Walter, além de referir a importância dos centros comunitários dos quais 70% foram construídos pelos moradores, falou do impacto da atitude do município que já notificou as associações, determinando sua desocupação, e o fim do fornecimento de água e luz. O dirigente destacou o esforço das lideranças de bairros para manter os centros em funcionamento, o que leva a maioria a cobrar taxa de uso, situação que sugere, seja regulamentada pelo movimento. A UAB ingressou na Justiça em nome das comunidades prejudicadas e chamou para a mobilização no dia 24, quando haverá a audiência sobre o recurso apresentado pelo seu jurídico.

No total, incluindo os vereadores, foram 24 manifestações contendo narrativas de situações específicas das comunidades, da necessidade de ficar atento ao projeto de poder que vem sendo desenvolvido pela atual administração, e ao alerta para não ceder à tentativa de dividir o movimento comunitário.

Ao final, o presidente da Comissão de Educação, vereador Edson da Rosa, lamentou a ausência da representação do Executivo, a quem será encaminhado um relatório da audiência.

“Informo que o poder de decisão não é da competência de nós, vereadores. O que nos cabe é ter a sensibilidade para as demandas da sociedade, dar voz e vez às suas lideranças e encaminhá-las institucionalmente ao Poder Executivo”, concluiu.